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Moribundo SUBurbano. Estereotipado: bandido, maconheiro e marginal. Escritor, poeta e, portanto, miserável.

quinta-feira, 29 de julho de 2010

Monólogo de Orfeu

Vínicius de Moraes/ Orfeu da Conceição
Este é um dos trechos mais bonitos do primeiro ato da peça, em que Orfeu sobressalta-se quando Eurídice lhe diz "Até, neguinho. Volto num instante".
Orfeu tem um mau presságio, e pede à amada que não o deixe. Eurídice responde: "Meu neguinho, que bobagem! E' um instantinho só. Volto com a aragem...

Orfeu:

Ai, que agonia que você me deu
Meu amor! que impressão, que pesadelo!
Como se eu te estivesse vendo morta
Longe como uma morta...

Eurídice:

Morta eu estou.
Morta de amor, eu estou; morta e enterrada
Com cruz por cima e tudo!

Orfeu (sorrindo):

Namorada!
Vai bem depressa. Deus te leve. Aqui
Ficam os meus restos a esperar por ti
Que dás vida!

(Eurídice atira-lhe um beijo e sai).

Mulher mais adorada!
Agora que não estás, deixa que rompa
O meu peito em soluços! Te enrustiste
Em minha vida; e cada hora que passa
E' mais porque te amar, a hora derrama
O seu óleo de amor, em mim, amada...
E sabes de uma coisa? cada vez
Que o sofrimento vem, essa saudade
De estar perto, se longe, ou estar mais perto
Se perto, - que é que eu sei! essa agonia
De viver fraco, o peito extravasado
O mel correndo; essa incapacidade
De me sentir mais eu, Orfeu; tudo isso
Que é bem capaz de confundir o espírito
De um homem - nada disso tem importância
Quando tu chegas com essa charla antiga
Esse contentamento, essa harmonia
Esse corpo! e me dizes essas coisas
Que me dão essa fôrça, essa coragem
Esse orgulho de rei. Ah, minha Eurídice
Meu verso, meu silêncio, minha música!
Nunca fujas de mim! sem ti sou nada
Sou coisa sem razão, jogada, sou
Pedra rolada. Orfeu menos Eurídice...
Coisa incompreensível! A existência
Sem ti é como olhar para um relógio
Só com o ponteiro dos minutos. Tu
És a hora, és o que dá sentido
E direção ao tempo, minha amiga
Mais querida! Qual mãe, qual pai, qual nada!
A beleza da vida és tu, amada
Milhões amada! Ah! criatura! quem
Poderia pensar que Orfeu: Orfeu
Cujo violão é a vida da cidade
E cuja fala, como o vento à flor
Despetala as mulheres - que êle, Orfeu
Ficasse assim rendido aos teus encantos!
Mulata, pele escura, dente branco
Vai teu caminho que eu vou te seguindo
No pensamento e aqui me deixo rente
Quando voltares, pela lua cheia
Para os braços sem fim do teu amigo!
Vai tua vida, pássaro contente
Vai tua vida que eu estarei contigo!

quinta-feira, 22 de julho de 2010

Alugam-se jovens desiludidos. Procurar o Globo

EM Igor Bruno, política

O Globo de hoje publica um artigo intitulado Jovem e desiludido. É mais uma xaropada para falar mal do Lula, da UNE e do movimento estudantil. O texto escamoteia uma verdade simples: uma das razões da suposta “desilusão” dos jovens é justamente o tratamento mesquinho, criminalizante, enfadonho, que a mídia dá à política. A mídia, como sempre, analisa um fenômeno sociológico como se ela, a mídia, não fosse um dos protagonistas do fenômeno.

Mas foi legal ler essa matéria para me deparar com aquele grupinho de estudantes que eu citei no post anterior, a Nova Organização Voluntária Estudantil, a Nove, formada, segundo o Globo, por estudantes que se uniram em 2009 para protestar contra o Enem e permaneceram como grupo estudantil “apartidário”.

Vamos comentar esse trecho da matéria:

(…) Bernardo Ainbinder, de 19 anos, diz que a desilusão vem de casa, “porque ouvimos desde pequeno, em casa e no colégio, que político é tudo igual”. A própria Nove pode ser exemplo do pouco interesse dos jovens: se ela teve 50 fundadores, hoje conta com oito membros.

- Muitos passaram a não ter mais tempo, ou viram que o grupo ainda precisava amadurecer, mas também houve saída por desinteresse – diz Ainbinder, aluno de relações internacionais da UFRJ, que também critica as entidades estudantis e as alas jovens dos partidos: – Embora esteja no estatuto dessas entidades que elas são apartidárias, o que a gente vê são “estudantes profissionais”, presidentes da UNE que saem para serem políticos, e um atrelamento ao governo.

A Ubes não atua. Perguntei na minha turma quem a conhecia, e só dois, de 60, levantaram a mão. A juventude dos partidos também não é atuante. Não há crítica ao programa do partido.

Repare que ele menciona a desilusão que “vem de casa”. Ou seja, esses jovens são filhos de uma classe média que vem sofrendo, há anos, uma lavagem cerebral promovida pelo jornal Globo (no caso dos fluminenses & cariocas). Não esqueçamos que, um dia após o golpe de Estado de 1964, houve uma passeata em Copacabana e Ipanema para comemorar e apoiar os militares. O jovem Ainbinder, em vez de aproveitar o espaço concedido pelo Globo, para se insurgir contra essa negatividade reacionária de seus pais, usa-o para reforçar os preconceitos contra a política, contra partidos, contra ideologias, contra o governo Lula.

Se tem pouca gente que conhece a Ubes, a culpa também é do Globo, porque as pessoas so conhecem aquilo que vêem na mídia.

Não estou botando a culpa de TUDO no Globo, um jornal reacionário e golpista, mas competente no que faz; não dá, no entanto, para suportar calado o Globo meter o malho nas entidades estudantis. Repare que ele faz uma matéria sobre a UNE e a UBES, mas não entrevista nenhum representante dessas entidades. Não, ele prefere entrevistar um integrante da “Nove”, uma entidade que segundo o próprio Ainbinder tem hoje apenas OITO membros. Nem a mais radical célula revolucionária situada no interior da floresta amazônica é tão diminuta. A UNE e a UBES representam milhões de estudantes. Promovem congressos, debates, passeatas. Obtiveram grandes vitórias políticas este ano, como a aprovação de 50% da verba do pré-sal para a Educação e o Estatuto do Jovem. Tem combatido com relativo sucesso pela manutenção da meia-passagem, benefício que os governos estão sempre tentando tirar dos estudantes. Enfim, a gente luta de verdade, na praça, com o povo. Não é a totalidade dos estudantes? E daí? É assim mesmo. Ingenuidade achar que, a esta altura do campeonato, teremos percentuais gigantescos de participação política entre os estudantes. Não dá para comparar o movimento estudantil de hoje com os anos 60, quando havia toda aquela atmosfera de revolução cultural, sexual, política. Hoje as coisas estão mais calmas. Além disso, a maioria dos jovens está muito empobrecida financeiramente; sua preocupação maior é como sobreviver no futuro próximo. Essa é uma de nossas frentes de luta. Geração de estágios, empregos e bolsas para os jovens poderem respirar, estudar, divertir-se.

São poucos os jovens que se envolvem no movimento estudantil? Sim, são poucos se pensarmos em termos percentuais. Mas não são OITO. São milhares, só no Rio.

Outra coisa: é natural, na minha opinião, que o jovem engajado nas lutas do movimento estudantil se alie a partidos políticos. Qual o problema? Faz parte do processo de politização. Não vivemos numa democracia representativa? Quanto ao atrelamento ao governo, a fala de Ainbinder é típica de um jovem alienado que só lê O Globo. Os estudantes se alinham ao governo quando acham que assim devem fazê-lo, e cobram uma contrapartida política. O governo Lula está dando essa contrapartida. Ajudou a UNE em diversas frentes, deu ganho de causa a ela para recuperar sua sede, tem conversado com as lideranças estudantis e acatado muitas de suas propostas. Enfim, os estudantis apóiam ou desapóiam quem eles quiserem, segundo suas consciências e seu bom senso. Não é o Globo que manda na opinião dos estudantes!

De http://www.falafera.net/site/

terça-feira, 20 de julho de 2010

Banho de Sinceridade

Esse texto já está postado nesse blog. Pretendo revive-lo apenas porque reviver o passado faz parte do presente.




Vou passar essa noite consultando meus livros de filosofia, e os de psicanálise também, a fim de descobrir qualquer significado de amor cuja tônica não esteja relacionada a qualquer tipo de dor. Assim que encontrar, e hei de encontrar, é óbvio. Vou copiar, recortar e carregar na carteira, para ler sempre que algum infortúnio, de qualquer grandeza, venha me descontrolar.

Vou, amanhã pela manhã, consultar qualquer mãe ou pai de Santo, pra que esses me expliquem o motivo pelo qual fracasso em quase tudo, e pra além disso, o motivo pelo qual, depois de ter estragado tudo, me empenho a fim de reparar também tudo. Vou, também amanhã, procurar meus amigos, perguntar-lhes se sou um homem sincero e humilde e amigo pelo qual vale a pena morrer, ou pelo menos se atracar com qualquer gigante. Vou, na parte da noite, ligar para todas as mulheres que magoei direta ou indiretamente. Não vou pedir desculpas, isso eu sempre faço. Eu vou, depois de ter lido muito e consultado meus orixás, explicar porque tenho sido um merda, quase sempre.

Vou conversar pessoalmente com as pessoas que me deram chances extraordinárias de emprego, pesquisa, estágio e intercâmbio, e explicar o motivo pelo qual não fiz nada correto, e porque não aceitei os convites.
Vou dançar Salsa com minha mãe e beijar o rosto do meu pai, de modo que ele possa perceber que todos esses anos sem beijo e sem “eu te amo”, culminaram nesse beijo no rosto.

Vou avisar todas as mulheres que me paqueram e, que projetam qualquer tipo de futuro comigo, que já sou apaixonado, já choro por alguém, já quero casar e ter filhos com alguém, já tenho alguém que me completa dentro e fora da cama, e que só vou ficar com elas, se for pra suprir todas as vontades reprimidas durante muito tempo de namoro. Quero dizer que não tenho namorada, e isso nada tem a ver com o fato de estar apaixonado. Eu gosto de me apaixonar e por isso o desamor é tão doloroso assim.

Nem sempre serei o homem pelo qual vocês se apaixonaram.Eu não valho a pena!
Não me liguem mais.